sexta-feira, 15 de abril de 2011

O Horcrux de Dorian Gray

Essa semana me perguntaram se esse livro que eu tava lendo era de vampiro:


Não, não, é só um clássico da literatura inglesa do final do século XIX.

A obra narra a história de Dorian Gray, um rapaz bonito e ingênuo que tem seu retrato pintado pelo amigo Basil Hallward. Ao conhecer o Lord Henry Wotton, Dorian se encontra absolutamente atraído pela visão de mundo que este lhe apresenta, segundo a qual a verdadeira razão da vida é a apreciação da beleza através do prazeres percebidos pelos sentidos. Ao se dar conta de que não será pra sempre jovem e belo, Dorian levianamente faz um pedido: deseja que seu retrato envelheça em seu lugar e ele retenha sua atraente beleza. Adivinha. O desejo se realiza e daí pra frente, mermão, é só ladeira a baixo...

Vou confessar que no começo achei O Retrato de Dorian Gray um saco. Pra mim era só um bando de aristocratas metidos a besta falando de como a vida é bela e que assuntos como política e filantropia são coisas de desocupados, etc e tal. O personagem do Lord Wotton é nesse sentido a maior máquina de pérolas do romance. Extremamente cético, misógino e espirituoso, ele é tão seguro do que fala, que acaba encantando o cabeça-de-vento do Dorian. Já o Basil, o pintor, morre de cíúmes porque seu "amigo" se deixa levar por um sujeito como o Lord. Vale lembrar que o autor, Oscar Wilde (que aliás era gay), ainda teve que dar uma abrandada nos tons homossexuais do romance pra não chocar a sociedade inglesa da época.

Mas, entretando, todavia, contudo, no entanto, essa primeira má impressão foi substituída pela noção de que esse era só o início. A real sacada da obra tá justamente no que se passa em seguida. Já que Dorian não envelhece, o peso dos erros dele recaem sobre o retrato, que vira uma espécie de espelho da alma corrupta do personagem. Mas não estamos falando de erros tipo "oops, esqueci de pagar a conta de luz", são mais como "oops, viciei meu amigo em ópio", "oops, matei", e por aí vai.

Com o passar dos anos Dorian passa de uma figura admirada, que atrai qualquer um que se aproxime, pra um sujeito escuso sobre o qual as pessoas cochicham pelas costas. Na sua busca pelo prazer e pela fruição da beleza, ele acaba se entregando a uma vida desregrada e cheia de vícios, na qual vive uma vida dupla visitando casas clandestinas de ópio e de prostituição e ainda frequentando as festas da alta sociedade. Esse, aliás, é um tema central na obra, que procura mostrar que a Estética, a "arte pela arte" (movimento que no Brasil corresponde ao Parnasianismo), é vã no sentido de que a vaidade exacerbada leva simplesmente à degradação da alma, ao invés de promover a beleza crua da arte.

O Retrato de Dorian Gray foi duramente reprovado pela crítica da época, tanto pelas insinuações homossexuais como pela suposta má influência que poderia causar nas pobres e castas mentes dos jovens que viessem a ler o livro. Felizmente hoje já é bastante cultuado e inclusive já teve algumas adaptações pra TV e pro cinema (a mais recente em 2009, intitulada Dorian Gray). Muito interessante a leitura pelos vários pontos de vistas não ortodoxos sobre a sociedade do fim do século XIX na Inglaterra, que na visão do autor era totalmente brega, e pela trajetória de decadência do ser humano desenfreado entregue somente aos prazeres da vida.
"Humanity takes itself too seriously. It is the world's original sin. If the cave-man had known how to laugh, History would have been different"

2 comentários:

  1. Boa noite, Eduardo.
    Encasquetei-me porque esse filme foi sofrivelmente sofrível, apesar de o livro ser mó linds!

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  2. Pô, sério? Achei bonzinho. Focaram bastante nos vícios dele, coisa que no livro é muito implícito. O que eu não gostei nenhum pouco foi que tentaram fazer ele de vítima e o Harry o malvadão. Sem contar naquela parte da filha dele com o Dorian... blé. É, acho que é podre mesmo. hahaha

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